balanços [na beira do Reno]


[chega setembro, o mês dos balanços. um post escrito na manhã de quarta-feira, dia 6 de agosto]

Estou de regresso da minha segunda vez em Basileia. Sentada na esplanada em frente ao rio, faço uma espécie de balanço dos dias aqui passados e inevitavelmente penso nos contrastes entre o meu país, a minha casa e a minha gente e o que cá encontrei, as pessoas que conheci e no que eu própria me transformo em circunstâncias assim.

Está um sol bom, é quase final de verão, dizem que a partir de setembro o tempo muda e, com ele, o resto também. 

São algumas as desvantagens de deixar uma cidade, um trabalho, uma casa que adoro, uma rotina para trás para levar a cabo uma mudança como esta. O afastamento da família é o que mais pesa, principalmente a mim, tanto emocional como, digamos, conceptualmente: a ideia das minhas filhas crescerem longe dos seus avós, tios e primos e dos meus avós, tios e primos custa-me. Porque, quer queiramos quer não, a Constança e a irmã serão meninas filhas de emigrantes que vão a Portugal duas ou três vezes ao ano para passar o verão ou o Natal. Claro que sendo relativamente perto [duas horas e meia de viagem] e com voos easyjet diretos e acessíveis, tanto Maomé irá à montanha como o contrário poderá acontecer, muitas vezes. Mas, ainda assim, não será, de todo, a mesma coisa. E eu, que admito ser uma lamechas e romântica, penso muito no que elas vão perder. 
Reparo que durante a manhã só as mães andam com os filhos nos carrinhos. Já a partir das 6 tarde vejo mais pais. Aos fins-de-semana, os dois. Seja com quem for, os miúdos andam muito na rua. Bem mais do que em Portugal.


Não vão conhecer devidamente as suas bisavós, senhoras de 90 anos com um papel tão central nas nossas famílias. Não vão saber o que são os almoços na casa da avó Mameca, onde há sempre lugar para mais um, nem participar das conversas à mesa, ouvir acerca dos cozinhados e as histórias que estão por detrás. A Constança não se vai lembrar de brincar na copa ou no jardim da casa da avó Celestina, dos domingos de outono em que vamos lá todos parar ou de estar quase diariamente com os padrinhos. A bebé que ainda não nasceu não terá uma fotografia por dia tirada pelo avô nem avós que a vão buscar ao colégio, um dia por semana. Aliás vão ser poucos os dias que vai passar perto deles, depois de nascer. São tantas as experiências que não vão fazer parte dos seus dias… Experiências e todo um conjunto de referências que elas não vão ter e que, na minha opinião [talvez porque eu vivi assim] são benéficas à formação delas como pessoas, como parte de uma família e de uma sociedade.

É meio dia e as pessoas começam a chegar para almoçar na beira do Reno. Vêm sozinhas ou acompanhadas, trazem uma manta e marmita, há quem até se ponha em fato de banho. A vontade [ou necessidade] de aproveitar o sol é tão óbvia que me preocupa. Como será aqui o inverno…



O Bernardo diz que estou a misturar as minhas recordações e motivações pessoais e que devo desapegar-me delas, para meu próprio bem. Ele é bom a desvalorizar. Eu não. Apesar de saber que serão maiores as vantagens, que não passam necessariamente e apenas por uma vida mais confortável. Há o tema da educação, da aprendizagem de novas línguas e a vantagem competitiva que lhes poderá conferir. Mais importante ainda: a curiosidade pelo mundo e pelas pessoas, a tolerância e o respeito pela diferença, a capacidade de adaptação a novos contextos, a autonomia que queremos incutir nelas e, na prática, uma maior liberdade. É isto que nos move.

Vejo o Bernardo ao longe. Traz bebidas numa mão e fuma um cigarro com a outra. Eu levo um saco de papel pardo com duas saladas, o molho num frasquinho, talheres, guardanapos e fruta para a sobremesa. É a nossa última refeição juntos, até ao mês que vem.

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3 comentários a “balanços [na beira do Reno]”

  1. bom dia……..somos 4 (pai, mãe e dois rapazes um com 3 anos, outro de 6) o pai esta em basel há dois anos….passamos la um ano ( fiz uma especie de escola em casa) este ano passamos todo o mes de julho e meio de agosto em basel….já conhecemos razoavelmente bem a cidade se precisarem de algumas dicas ou se quiserem trocar desabafos com mais promenores o meu mail é [email protected]
    ou aqui-http://umademim.blogspot.pt/
    às vezes almoçamos no pimenta ( um restaurante portugues) em basel posso dar endereço

  2. Querida Ana,

    Eu e a minha família chegámos a semana passada de umas deliciosas férias no nosso espectacular país.
    Apesar de termos corrido muito e de nos termos esforçado por estar com toda a família, amigos e para voltar a desfrutar de tudo de bom o que o nosso país tem, o facto, é que os dias galoparam a um ritmo estonteante e apesar de voltarmos com a alma mais aconchegada, soube-nos a pouco.
    Agora, lá vamos nós para mais um período desta nossa ainda recente aventura de emigrantes em terras belgas.
    Sempre que volto a Portugal e observo os meus filhos com a nossa família e os nossos amigos ou simplesmente a brincarem num parque com desconhecidos mas a falarem a sua língua, concluo que tudo isto que eles podem ter em Portugal, provavelmente, seria muito mais benéfico para o seu desenvolvimento nesta fase das suas vidas.
    Bolas! Eu fui criada em Portugal, cresci junto da minha família, bebi directamente dos valores e ensinamentos dos meus pais, avós, tios, primos e não é por isso que deixei de me tornar uma mulher civicamente bem formada, que respeita ou outros na diferença e que mesmo crescendo em Portugal, sabe falar mais duas línguas.
    Agora, aqui, eu também digo a mim mesma que este ambiente multicultural, com a aprendizagem de todas estas línguas e culturas é espectacular para os meus filhos, mas o facto é que penso que eles teriam tempo nas suas vidas para se enriquecerem neste capítulo.
    Agora e nesta fase das suas vidas, o que era mesmo bom, era eles terem a família ao virar da esquina.
    Mas por agora…esse sonho não pode mesmo acontecer.

    Não se pode ter o melhor de dois mundos e o facto é que o ser humano, com mais ou menos sofrimento, habitua-se a tudo.
    O meu amor maior diz que eu e sou demasiado emocional e apegada às recordações. Ele é muito mais desprendido e nestas alturas também é bom ter uma pessoas assim ao nosso lado, para nos sacudir o pó!

    Lamento, não ter sido muito positiva hoje….

    Mil beijos e muita força!!!!

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